quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Mário Lisboa entrevista... Marcelo Rebelo de Sousa

Olá. A próxima entrevista é com o político e professor Marcelo Rebelo de Sousa. Uma das personalidades mais marcantes da vida política portuguesa, desde muito cedo que se interessou pela Política, tendo sido, por exemplo, líder do PSD (partido, da qual aderiu, após a sua fundação, em 1974), e além da Política, também é professor, e têm experiência na Comunicação Social, estando, atualmente, na TVI, como comentador político. Esta entrevista foi feita, por via email, no passado dia 27 de Outubro.

M.L: Quando surgiu o interesse pela Política?
M.R.D.S: Quando assisti às conversas políticas em família, entre os meus Pais, e entre eles e muitos amigos. E quando, na minha escola primária, com uma diretora muito aberta na Europa, havia debates políticos e quatro clubes, chamados Casas, geridas pelos alunos e participando na própria programação de atividades culturais e desportivas da Escola.

M.L: Quais são as suas influências nesta área?
M.R.D.S: Os meus Pais, os meus professores, alguns amigos, leituras, a partir dos dez, onze anos, sobretudo de autores de língua francesa, num tempo em que a influência dominante era francófona. Só depois, pelos quinze ou dezasseis anos, passou a ser importante a influência anglófona.

M.L: Além da Política, também é professor. Em qual destas funções em que se sente melhor?
M.R.D.S: A minha vocação é ser professor. Funções políticas: exerci-as em momentos muito específicos. E uma vocação é sempre mais importante do que uma função.

M.L: Têm experiência na Comunicação Social, estando, atualmente, na TVI, como comentador político. Que balanço faz do tempo em que está no canal?
M.R.D.S: Fiz imprensa na escola, desde os dez anos. Fiz imprensa em órgãos de comunicação nacionais, desde os quinze anos. Fiz televisão, pontualmente, desde os vinte e três anos. Fiz rádio, regularmente, entre 1993 e 1996. E um programa na televisão (TVI) com vários amigos, entre 1993 e 1994. Passei a fazer televisão, regularmente, também na TVI, em 2000 e até 2004. Tive de sair e mudei para a RTP, onde estive de 2005 a 2010. Estou, novamente, na TVI, há três anos e meio. A imprensa permite outro tempo e outra reflexão, mais longa e profunda. A televisão tem muitíssimo mais audiência, mas é de gestão extremamente desgastante, obrigando à procura constante de novas ideias e de fórmulas (livros, notas, imagens, conversas com terceiros, programas a partir de fora do estúdio). A rádio é, hoje em dia, um meio auxiliar, mas o mais flexível e, talvez, o mais divertido. Infelizmente, sem o peso que já teve. Na TVI, faço um balanço positivo. Deparei sempre com um ótimo clima. De 2000 a 2004, salvo o episódio da saída. De 2010 até hoje. Mudei muito de estilo, de tempo, de formato, de entrevistadores. E isso foi bom. Deve procurar-se inovar, de tanto em tanto tempo. Eu diria, de ano e meio em ano e meio. Até que eu sinta que chegou ao fim a experiência. Aí, é essencial saber deixar saudades e não ter de ser empurrado à força.

M.L: A TVI celebra, este ano, 20 anos de existência. Como vê o percurso que o canal tem feito até agora?
M.R.D.S: Começou como a televisão da Igreja Católica. Programaticamente forte, mas de espetro de audiência limitado. Mudou para televisão popular, muito virada para classes C e D, embora sem esquecer as restantes, para mulheres e jovens no final da década de 90. Mudou, já no novo século, de direção, e teve de se adaptar, também, a outro tempo (com a Internet e o cabo a subir rapidamente). Se na primeira fase, a liderança de audiências foi, de início, da RTP, passou, a seguir para a SIC, onde esteve quase uma década. Na viragem do século, a TVI assumiu a liderança e tem-na mantido no dia, com escassas exceções. No tempo nobre da publicidade, das 20 horas até às 24 horas, tem liderado até há poucos meses (altura em que a SIC se aproximou e passou a disputar, arduamente, a liderança). Neste momento, a TVI lidera dia e tempo nobre, tal como lidera neste mês de Outubro. Mas é uma luta apertada no tempo nobre. Em geral, a TVI teve o mérito de cativar classes mais pobres, de promover a telenovela portuguesa, de olhar para o público feminino, de conceber novas formas de opinião, de abrir para programas com participação em direto e temas comportamentais, de valorizar novas dimensões de reportagem. O preço foi, muitas vezes, um peso excessivo de reality-shows e de telenovelas, e de informação emotiva e baseada na sensação, para não dizer sensacionalismo, mais do que na análise. Teve sempre, mesmo na primeira fase, uma coisa que aprecio: um clima de grupo excursionista, lançado na aventura, e na descoberta, muito jovem, desempoeirado, divertido, nada burocrático, disponível para recriar, permanentemente, o futuro.

M.L: Como vê, atualmente, a Política em Portugal?
M.R.D.S: Numa época muito difícil. Por causa da crise. Por causa do cansaço de muitas portuguesas e de muitos portugueses. Por causa do distanciamento das pessoas. Por causa da frustração dos mais velhos, que sonharam outro futuro e dos mais novos que acham que não têm futuro. Por causa do afastamento de gente de qualidade que prefere não ocupar cargos políticos. Por causa da mudança de gerações. Por causa da dificuldade dos partidos e dos parceiros sociais se reformarem a si próprios. É um tempo ingrato para se ser político e para se acreditar na política e nos políticos. Mas a Democracia faz-se todos os dias e com gente nova. Logo, há que fazer mais e melhor com nova gente e não desistir da Democracia.

M.L: Como lida com o público que acompanha o seu percurso profissional, há vários anos?
M.R.D.S: Todos os dias. Aos milhares. Antes, era por carta. Depois, por fax. Agora, por email, salvo o menos jovem, que ainda escreve cartas. São centenas de mensagens, pedidos, queixas, sugestões, aplausos, reparos, convites, presentes... Eu sei lá. Sempre um bom barómetro da situação nacional. Por exemplo, os pedidos de apoios financeiros começaram em 2008 e não deixaram de subir até hoje, obrigando a um trabalho enorme para apurar factos, selecionar casos mais urgentes ou dolorosos e apoia-los. Respeito e, mais do que isso, gosto imenso do meu público (algum dele fiel há dezenas de anos). E faço tudo para, com trabalho e dedicação, continuar a merecer a sua confiança, expressa em audiências que, francamente, ultrapassam as minhas expectativas mais otimistas.

M.L: Qual o conselho que daria a alguém que queira ingressar numa carreira na área da Política?
M.R.D.S: Como conselho, eu diria: nunca dependam da política para viver, para não se converterem em mercenários políticos, capazes de tudo para manterem os vossos lugares. Ganhem a vossa independência profissional, tenham um lugar de recuo, para a saída, e só depois avancem para lugares. Diferente é fazerem política de base, sempre, onde moram, onde estudam, onde trabalham, em ONG, em IPSS, em partidos ou fora deles, em associações culturais, sociais, económicas. Isso faz-se todos os dias e pode ser bem mais importante do que ocupar cargos ou ser titular de funções sem conteúdo, sem espaço de manobra ou que não correspondam às vossas ideias ou maneira de ser.

M.L: Que balanço faz do percurso profissional que tem feito até agora?
M.R.D.S: Olho para trás e penso que fui um bom professor. A seguir, mas só a seguir, fui um bom comunicador, como se diz agora. E, depois, fui um bom gestor de empresas jornalísticas e da minha Faculdade. E tento ser um bom gestor da instituição fundacional que sirvo há ano e meio. Cumpri no que era o essencial da minha vida. Poderia ter feito mais ou melhor. Mas o que fiz, parece-me, genericamente, bem. Ressalvo que ninguém é bom juiz em causa própria.

M.L: Qual é a coisa que gostava de fazer e não tenha feito ainda?
M.R.D.S: Gostava de visitar sítios, onde nunca fui, como São Petersburgo, ou ter tempo para editar obras que sonhei, mas demoram, como algumas lições académicas. Mas, sobretudo, adorava ter mais tempo para duas coisas: estar com os netos, o que não é fácil, por viverem no Brasil, e ter mais tempo, de novo, para voluntariado, no domínio da saúde, em particular, dos cuidados paliativos.

M.L: O que é que gostava que mudasse nesta altura da sua vida?
M.R.D.S: O que todos, em Portugal, desejam ardentemente: voltar a viver num País, sem o sufoco de uma crise na sua fase ainda aguda, mesmo em aparente caminho para uma lenta saída. E, com isso, eu, que sou um otimista realista, mas otimista, poder deparar com outra crença, outra vontade de acreditar e alegria de viver, como sentimentos coletivos. E já agora com um sonho ou, pelo menos, desígnio comunitário! Está a fazer falta esse sonho ou desígnio. Batermo-nos por nada ou por metas de défice que nunca estão certas é pouca coisa... Muito pouca coisa.ML

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